A Vida de Bento de Núrsia – Parte 1
Introdução
A fonte de todos os
acontecimentos da vida de São Bento são os Diálogos de São
Gregório Magno (540-604), redigidos por volta de 593, que se baseou em
fatos narrados por monges que conheceram pessoalmente São Bento.
Por este motivo,
neste simples trabalho, parafraseei o livro de Gregório Magno para que nosso
conhecimento seja totalmente baseado em fontes históricas primárias, visto que
Gregório é o seu primeiro biógrafo. Todas as demais biografias se baseiam
diretamente nos Diálogos.
Em seus Diálogos,
Gregório conversa com um discípulo chamado Pedro. Após os milagres narrados,
Pedro fez perguntas e Gregório responde com citações Bíblicas apropriadas. Este
diálogo com Pedro eu omiti para dar mais fluidez ao texto como narrativa
histórica e alterei algumas palavras com o mesmo objetivo. No demais, o texto
permanece íntegro.
Aconselho, porém, a
leitura dos Diálogos para conhecer as respostas de Gregório e suas bases
bíblicas.
A Vida de Bento de Núrsia
“Houve um varão
de vida venerável, Bento; tanto pela graça quanto pelo nome, que desde a
infância possuía um coração maduro. Superior, pelo seu modo de proceder, ao
verdor da idade a nenhuma volúpia entregou seu coração, e assim, enquanto se
achava nesta terra, da qual por algum tempo pudera gozar livremente, desprezou,
como já murchas, as flores do mundo” (Prólogo de Gregório Magno ao segundo
Livro dos Diálogos).
Gregório narra a vida
de Bento através de quatro discípulos seus: “Constantino, homem
respeitabilíssimo, que lhe sucedeu na direção do mosteiro; Valentiniano, que
regeu por muitos anos o mosteiro do Latrão; Simplício, que foi o seu segundo
sucessor na direção da comunidade; Honorato, que até hoje dirige o mosteiro
onde Bento antes viveu” (Prólogo).
I.
A Fuga do Mundo
Bento nasceu em uma família
nobre da província de Núrsia, Itália. Muito cedo, foi enviado a Roma para o
estudo das belas letras.
Em Roma ficou
escandalizado com tanto pecado que entendeu que poderia se desviar do caminho
do Senhor. Por isso resolveu abandonar os estudos, sua casa e seus bens e
procurou o monaquismo.
Resolveu procurar um
lugar ermo e foi seguido por sua aia (que ajudou a cria-lo e o amava como
filho).
Chegaram, assim, a certa localidade chamada Enfide, onde,
“entretidos pela caridade de muitos homens de virtude, ficaram morando junto à
igreja de S. Pedro Apóstolo”.
Um dia, a ama pediu
às vizinhas que lhe emprestassem um crivo para limpar o trigo; tendo-o, porém,
deixado descuidadamente sobre a mesa, o crivo caiu e se quebrou, ficando
partido em dois pedaços. Logo que voltou e o encontrou nesse estado, a mulher
começou a chorar muito, aflita por ver quebrada a vasilha que tomara de
empréstimo. Quando, porém, Bento encontrou a ama chorando, compadecido da sua
dor, pegou os dois cacos do vaso, e, levando-os consigo, entregou-se à oração
com lágrimas. Quando se ergueu da oração, viu junto de si o crivo de tal forma
íntegro que nenhum vestígio se podia descobrir da fratura. Então, pronta e
carinhosamente consolou a ama, devolvendo-lhe são o vaso que levara em cacos.
Bento,
procurando uma vida de silêncio e sacrifício, longe dos elogios e louvores do
mundo, fugiu ocultamente da ama e foi dar a um retiro deserto, distante de Roma
cerca de quarenta milhas.
Quando para ali se
encaminhava em fuga, encontrou certo monge de nome Romano, que lhe perguntou
aonde ia.
Ciente do seu desejo,
não só guardou segredo mas ainda lhe prestou ajuda e deu o hábito do monacato,
servindo-o no que podia.
Chegado a tal lugar, o homem de Deus recolheu-se à apertadíssima
gruta, onde morou três anos ignorado de todos, excetuado o monge Romano.
Este
último vivia num mosteiro próximo, sob a regra do abade, a cujo olhar
piedosamente furtava algumas horas para levar a Bento, em determinados dias, a
parte de pão que conseguira subtrair ao próprio consumo.
Não havia caminho do
mosteiro de Romano à gruta, por causa de alto rochedo que em cima da gruta
fazia saliência; mas Romano, do alto dessa pedra, costumava fazer descer o pão
pendurado a uma corda comprida a que prendera uma campainha para que o homem de
Deus, ao ouvir-lhe o toque, soubesse que era a hora de baixar o alimento, e
saísse a tomá-lo.
Um dia, porém,
quando o pão era descido, uma pedra caiu e quebrou a campainha. Romano, não
obstante, não desistiu de prestar por meios aptos o seu serviço.
O Senhor apareceu a
certo presbítero que morava longe e acabava de preparar, no dia de Páscoa, a
própria refeição; disse-lhe: “Preparas delícias para o teu próprio gozo,
enquanto o meu servo em tal lugar é atormentado pela fome'.” O sacerdote
levantou-se imediatamente e no próprio dia da solenidade de Páscoa, com os
alimentos que para si preparara, saiu na direção indicada, procurando o homem
de Deus através dos montes escarpados, pelos vales e fossas do terreno, até que
o achou escondido na gruta.
Depois de orarem,
assentaram-se agradecendo a Deus. O presbítero disse: “Eia, tomemos alimento,
porque hoje é Páscoa”. Respondeu-lhe Bento: “Sei que é Páscoa, pois mereci a
graça de te ver”.
Morando longe dos
homens, Bento ignorava que a solenidade pascal era naquele dia; mas o venerável
presbítero de novo lho asseverou: “Em verdade hoje é Páscoa, o dia da
Ressurreição do Senhor. De modo nenhum te fica bem jejuar, pois aqui fui
mandado justamente para que juntos partilhemos as dádivas de Deus todo-poderoso”.
Louvando, pois, o Senhor, tomaram alimento; e, finda a refeição e a conversa,
voltou o padre para a sua igreja.
2. A Fama de Bento
Por esse mesmo tempo
também alguns pastores o encontraram escondido na caverna. Vendo-o entre
arbustos, vestido de peles, julgaram a principio que fosse um animal selvagem;
mas, quando ficaram conhecendo o servo de Deus, muitos se converteram da sua
mente animal para a graça de uma vida piedosa. Assim o nome de Bento tornou-se
conhecido pelos arredores; já desde então Bento começou a ser visitado por
muitos que, trazendo-lhe a refeição para o corpo, levavam, em troca, nos
corações, o alimento de vida que procedia dos lábios do santo.
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